A Consagração para o Sacerdócio Levítico - Silas Daniel. A cerimônia de consagração para o sacerdócio levítico evidenciava a grande responsabilidade e a importância desse ministério tanto para quem haveria de exercê-lo quanto para o seu beneficiado direto — o povo, que assistia a essa solenidade. Essa cerimônia tinha tanta relevância, que Deus deu a Moisés todos os detalhes de como ela deveria ocorrer. Eles estão registrados em Êxodo 29.1-46 e incluíam uma cerimônia de santificação do altar para o sacrifício.
Deus estabeleceu o sacerdócio como “estatuto perpétuo” (Êx 29.9), o que significa que ele era imutável e deveria ocorrer enquanto o Santuário existisse. A expressão hebraica traduzida por “perpétuo” nessa passagem traz a ideia de “imutável”.
Para aqueles que iriam exercer esse ministério, ao final das orientações referentes à cerimônia, Deus promete abençoar todas as obras do seu ofício. O Senhor é assim: Ele não apenas nos cobra responsabilidades; Ele também promete estar conosco e nos abençoar em tudo o que precisamos fazer para a sua glória e a bênção do seu povo.
Vejamos a seguir alguns aspectos dessa cerimônia e como ela aponta para princípios que todo obreiro do Senhor não deve olvidar, objetivando o seu amadurecimento espiritual no serviço do Mestre.
As Mensagens Expressas na Consagração de Arão e seus Filhos
Em Êxodo 29.1, já nos é apresentada na introdução a razão por que esse cerimonial precisava ser feito: “para os santificar”. Arão e seus filhos só poderiam começar a “administrar o sacerdócio”, como diz o texto, depois que fossem santificados, e essa santificação ocorreria justamente através dessa cerimônia. Esse propósito é asseverado não só na introdução das orientações para a cerimônia, mas também no seu final (Êx 29.44).
Como ressaltamos na abertura deste capítulo, essa consagração servia para colocar em relevo a responsabilidade e a importância do ministério sacerdotal levítico. Por meio dessa cerimônia, o povo era cientificado e rememorado de que aquelas pessoas que estavam ali eram chamadas por Deus. Elas não eram pessoas que estavam ali simplesmente porque queriam ou porque se achavam competentes para tal. Estavam ali porque Deus as chamara, como afirma o escritor da Epístola aos Hebreus, que também ressalta a ligação do sacerdócio levítico com o ministério de Cristo: “E ninguém toma para si essa honra, senão o que é chamado por Deus, como Arão. Assim, também Cristo não se glorificou a sim mesmo, para se fazer sumo sacerdote, mas glorificou aquele que lhe disse: Tu és meu Filho, hoje te gerei” (Hb 5.4,5).
A grande mensagem inicial desse cerimonial era sublinhar o fato de que as pessoas que estavam ali para serem apresentadas para aquele serviço especial eram chamadas, escolhidas, eleitas pelo próprio Deus para aquela tarefa. Esse era o significado primordial da consagração.
Em segundo lugar, essa cerimônia dizia a todos que aqueles homens não se dedicariam a outra coisa: eles se dedicariam tão somente, exclusivamente, àquele serviço para o qual estavam sendo apresentados.
Em terceiro lugar, como lembra Matthew Henry, a expressão em hebraico para “consagrar” em Êxodo 29-9 é “encher as mãos”. Em vez de “sagrarás a Arão e seus filhos”, que é uma tradução correta para o final desse versículo, podemos colocar também “tudo porás nas mãos de Arão e nas mãos de seus filhos”. Da mesma maneira, “o carneiro das consagrações” (Êx 29.22,26) significa também “o carneiro posto nas mãos” de Arão e seus filhos.1 Esse significado “mãos cheias” fala-nos de mãos ocupadas. Sim, quem é consagrado para Deus é uma pessoa que passa a ter as suas mãos ocupadas. A sua vida ganha uma direção específica, um norte determinado, um rumo estabelecido; o trabalho de Deus o consome, toda a sua vida é preenchida, afetada e envolvida pelo seu chamado. Ele é consagrado, e quem é consagrado é alguém ocupado. O trabalho da sua vida é definido pelo seu chamado.
Em quarto lugar, a consagração de Arão e seus filhos falava também de aperfeiçoamento. Era só a partir da consagração que eles estavam finalmente autorizados a iniciar seu ofício conforme lhes havia sido ensinado. A partir daquele momento, eles poderiam começar o seu trabalho, pois já estavam preparados para o serviço. O seu preparo estava concluído e a consagração era o sinal verde de Deus para que começassem. Era hora de arregaçar as mangas e trabalhar. Eles estavam preparados.
E finalmente, em quinto lugar, a consagração fala de capacitação divina para o serviço. Esses homens eram... Homens! E como homens, eram, portanto, fracos, como ressalta o escritor da Epístola aos Hebreus (Hb 7.28). Mas, através daquela consagração, Deus estava dizendo: “Eu estarei com vocês! Eu estou capacitando-os. Meu Espírito estará sobre a sua vida em todas as obras deste importante trabalho para mim e em favor deste povo. Por meio de vocês, Eu abençoarei o povo de Deus”. Essa é a mensagem que Deus transmite ao final das orientações para essa cerimônia, e que está expressa nos dizeres “Vos encontrarei para falar”, “Por minha glória serão santificados”, “Santificarei a Arão e seus filhos, para que me administrem o sacerdócio”, “E habitarei no meio dos filhos de Israel e lhes serei por Deus, e saberão que Eu sou o Senhor, seu Deus, que os tenho tirado da terra do Egito, para habitar no meio deles; eu, o Senhor, seu Deus” (Êx 29.42-46).
A Cerimônia de Consagração
Eis alguns aspectos importantes dessa cerimônia de consagração:
A lavagem com água (Êx 29.4), utilizando a água da pia de bronze (Êx 30.17-21). Ela nos fala de purificação, pureza, santificação, perfeição. Essa lavagem com água simboliza a purificação pelo sangue de Jesus e a Palavra de Deus (1 Jo 1.7; Jo 15.3;
17.17). O escritor da Epístola aos Hebreus nos lembra que sem santificação, “ninguém verá o Senhor” (Hb 12.14). A mensagem aqui, enfim, é que ninguém pode se apresentar ao serviço do Senhor sem santificação, sem procurar viver uma vida de santidade.
Colocação, em seguida, das vestes especiais para o ofício (Êx 29.5,6,8,9). Após a lavagem, eles estavam prontos para colocar suas novas vestimentas, próprias e específicas para o trabalho que exerceriam. Sobre o significado dessa indumentária, já falamos bastante no capítulo anterior. A mensagem aqui é que “não era suficiente que removessem a corrupção do pecado [pela lavagem da água]”, mas também “deveriam vestir as graças do Espírito, vestirem-se de justiça (SI 132.9). Eles deveriam ser cingidos, como homens preparados e fortalecidos para o seu trabalho. E deveriam ser vestidos e coroados, como homens que consideravam o seu trabalho e as suas funções uma verdadeira honra”.2 e a bênção e Deus aos outros: “Tem cuidado de ti mesmo [...] fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo como aos que te ouvem” (1 Tm 4.16). Como alguém poderá ajudar perfeitamente aqueles que se encontram doentes enquanto ele mesmo ainda se encontra doente?
Em seguida, deveria haver ainda um holocausto não de expiação de culpas, mas especificamente em honra a Deus, e a oferta sobre ele deveria ser totalmente queimada, simbolizando a dedicação total daqueles homens ao serviço do Senhor (Ex
29.15-18). O fogo consumindo toda a oferta fala de entrega total ao serviço. E o fato de essa oferta só poder ser apresentada após a oferta pela expiação dos pecados desses sacerdotes significa que “até que a iniquidade seja retirada, nenhum serviço aceitável pode ser realizado”,3 o que nos lembra da purificação de Isaías para poder servir no ministério profético como Deus queria (Is 6.7).
A oferta pacífica vinha depois, o chamado “carneiro das consagrações” (Êx 29.19-37) ou “sacrifício da posse”. Todos esses sacrifícios apontavam para o Calvário, para a obra de Cristo na cruz. Nesse sacrifício em especial, o sangue da vítima inocente deveria ser aspergido tanto sobre o altar quanto sobre as vestes e o corpo dos sacerdotes — no caso, sobre a ponta da orelha direita, o dedo polegar da mão direita e o dedo do pé direito de todos eles. O azeite também era espargido sobre eles e suas vestes. Isso tudo era para santificação de todos eles (Êx 29.20,21). Significava santificação de sua atenção (orelha direita), do seu trabalho (mão direita) e de seu andar, seu proceder (pé direito); e o sangue e o azeite juntos falam do sangue de Cristo e do Espírito Santo, da justificação e da santificação, do perdão e do poder purificadores. Aliás, o Espírito Santo é quem aplica a obra de Cristo em nossa vida, operando a santificação. O restante do ritual, conforme descrito no texto sagrado, é muito bem sintetizado pelo Comentário Bíblico Beacon:
Moisés poria nas mãos dos sacerdotes partes deste carneiro das consagrações, junto com porções do pão, bolos e coscorões que estavam na cesta (Ex 29.22,23; ver v.2). Por um movimento horizontal em direção ao altar, os sacerdotes tinham de apresentá-los como oferta ritualmente removida, simbolizando entrega a Deus (v.24). Depois, Moisés queimava a porção de Deus no altar (v.25) por cheiro agradável ao Senhor. Retinha o peito do carneiro das consagrações para si (v.26), a parte que normalmente ia para o sacerdote que oficiava a oferta do peito do movimento. O peito e o ombro dos sacrifícios pacíficos — como pode ser chamado este tipo de oferta (v.28) — eram porções habituais para o sacerdote (v.27). O peito era movido em movimento horizontal e o ombro era alçado (ou erguido) em movimento vertical em atos simbólicos de dá-los a Deus.4
As ofertas diárias se seguiam durante sete dias, que era o tempo que durava a cerimônia de posse do novo sacerdote. Arão e seus filhos cozinhavam e comiam juntamente com o que sobrava do cesto do pão e as porções de carne não queimadas do altar ou que haviam sido dadas a Moisés. O mesmo também ocorria no caso da oferta pacífica. Esse pão e essa carne dos quais os sacerdotes participavam, e que os santificavam, representavam o corpo de Cristo, cuja carne era simbolizada no Novo 1 estamento pelo pão da Santa Ceia (Mt 26.26; 1 Co 11.24). Um detalhe interessante e que as vestes do sumo sacerdote eram passadas para o seu filho por ocasião da consagração deste como novo sumo sacerdote (Ex 29.29,30). O novo sumo sacerdote deveria passar pelo mesmo cerimonial de consagração de seu pai, com o azeite sendo derramado sobre aquelas vestes mais uma vez — e sobre ele, pela primeira vez. A indumentária não seria nova — seria a mesma usada por seu pai —, mas a experiência seria nova para o novo sumo sacerdote. Isso fala que as responsabilidades, representadas aqui pela indumentária, se transferem, mas a consagração e a unção, não. O novo ministro tem que ter a sua própria experiência de confirmação e capacitação para o ofício dadas por Deus.
Cristo, nosso Sumo Sacerdote Perfeito e Eterno
A ordem sacerdotal de Cristo não era a de Levi, mas a de Melquisede- que (Hb 5.6,10; 7.1-28), e a Bíblia nos apresenta Jesus como aquEle que tem um “sacerdócio perpétuo” (Hb 7.24), isto é, imutável.
A perpetuidade do sacerdócio levítico era garantida por meio da continuação da linhagem levítica, pelo “grande número” de seus sacerdotes que se sucediam com
o Só que o “sacerdócio perpétuo” de Jesus é muito mais poderoso, pois se assenta na sua eternidade, além da perfeição e do caráter definitivo de seu sacrifício (Hb 7.24-27). Ele era perfeito, por isso seu sacrifício e serviço foram perfeitos (Hb 7.26-28).
Louvemos a Cristo, que nos deu livre acesso à presença de Deus por meio do seu ministério perfeito e definitivo, um ministério perpétuo em nosso favor, no qual Ele está “sempre vivendo para interceder por todos” nós (Hb 7.25b). Aleluia!
1 HENRY, Matthew. Comentário Bíblico do Antigo Testamento — Gênesis a Deuteronômio. Rio de Janeiro: CPAD, 2010, p. 320.
2 HENRY, Matthew. Comentário Bíblico do Antigo Testamento ----- Gênesis a Deuteronômio. Rio de Janeiro: CPAD, 2010, p. 320.
3 HENRY, Matthew. Comentário Bíblico do Antigo Testamento ----- Gênesis a
Deuteronômio. Rio de Janeiro: CPAD, 2010, p. 321.
4 LIVINGSTON, George Herbert. Comentário Bíblico Beacon. v. 1. Rio de Janeiro:
CPAD, 2005, p. 218, 219.
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