Só uma coisa deve andar crescendo no Brasil mais do que a burrice e a intolerância: o número de pessoas dispostas a votar em Marco Feliciano (PSC) nas próximas eleições legislativas. Ele conta com cabos eleitorais fortíssimos: o principal é Jean Wyllys (PSOL-RJ), que, em 2014, também não precisará mais de Chico Alencar. Ainda que ambos rejeitem a parceria, dançam um minueto. São os antagonistas da narrativa. A imprensa faz a campanha de ambos.
Feliciano conta ainda com a assistência involuntária das Fernandas, mãe e filha, da imprensa, das ONGs, do site Avaaz (aquele comandado por Pedro Abramovay) e dessa algaravia dos politicamente corretos, segundo quem, sob certas circunstâncias, a gente pode dar um pé no traseiro da democracia.
E Feliciano não se faz de rogado.
Não vai renunciar porque, a exemplo do seu antípoda nessa pantomima, também não é besta. Se cai fora, tangido pela gritaria, ele se desmoraliza. Se fica, se fortalece no embate com a… gritaria. A Folha desta segunda dá destaque a uma fala sua num culto num ginásio da cidade mineira de Passos, ocorrido na sexta. Enquanto ele falava aos fiéis, do lado de fora do templo, ocorriam os protestos. Ele mandou ver: “Essa manifestação toda se dá porque, pela primeira vez na história desse Brasil, um pastor cheio de Espírito Santo conquistou o espaço que até ontem era dominado por Satanás”.
Pois é… E agora? Na Câmara, ele está sendo tratado como “pastor”, e querem deslegitimá-lo por isso, o que é o fim da picada, por mais que se discorde de suas ideias. No culto, pois, ele pode, como resposta, lembrar a sua condição de deputado. O que fazer? Não há nada a fazer. Ainda que pareça exótico e ainda que eu não acredite nisto, o fato é que ele é livre para achar que Satanás comandava a comissão antes de sua chegada. Já que tentam demonizá-lo, ele resolve identificar o demônio naqueles que o atacam.
Não vejo como Feliciano possa ser tirado de lá, a menos que renuncie. Caso se operem estratégias pouco regimentais e manobras para torná-lo inviável, tanto melhor para a sua campanha de 2014. Não precisará fazer muito esforço. Quem anda perdendo com tudo isso é a Comissão de Direitos Humanos e Minorias, que tem outros assuntos na pauta. O deputado do PSC resolveu fazer do limão uma limonada: “A natureza deles é gritar, xingar, falar palavras de ordem. É dar beijos no meio da rua, tirar a roupa. A natureza deles é expor um homem como eu, pai de família, ao ridículo”.
Essa questão está se transformando num confronto de caricaturas. E a degradação contínua do debate decorre do fato de se ignorarem os parâmetros e os fundamentos de uma sociedade democrática. Os inconformados com a presença de Feliciano na comissão dispõem dos mais variados meios — e do apoio quase unânime da imprensa — para fazer chegar a sua voz à sociedade.
Inaceitável é impedir o pleno funcionamento de um Poder da República porque grupos organizados não concordam com o pensamento de um deputado. Da mesma sorte, é pura expressão da truculência tentar inviabilizar os cultos religiosos de que ele participa. Duvido que tenha tido antes, em sua trajetória política, inimigos tão úteis. Até o Caetano Veloso e o Chico Buarque já se pronunciaram. Sobre a presença dos condenados José Genoino e João Paulo Cunha na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, nem um nem outro disseram nada. Tampouco se manifestaram outros artistas e celebridades.
Sei lá o que anda a fazer Satanás. Não tenho intimidade com o coisa-ruim. Mas dá para saber perfeitamente bem o que andam a fazer os tolos e os oportunistas.
Por Reinaldo Azevedo
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